As mesas do terceiro dia do Congresso de Ensino e Pesquisa do IF Baiano levaram ao público discussões de relevância na atualidade em que observa-se muitos tensionamentos raciais e de questionamentos da ciência. A primeira discutiu sobre racismo de forma transdisciplinar e a segunda teve como ponto alto o debate sobre fake news e propagação de desinformação científica nos ambientes digitais.
Cidadanias linguísticas negadas
A mesa sobre Cidadania linguística, multilinguismo e racismo, realizada na manhã de ontem (17), contou com a contribuição dos docentes da área de linguística, Gabriel Nascimento, da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), e Ivo Ferreira de Jesus, do IF Baiano Campus Santa Inês, e da docente Alexandra Bomfim de Oliveira do IF Baiano – Campus Teixeira de Freitas da área de ciências biológicas.
O docente convidado, Gabriel Nascimento, abriu as falas, defendendo que a linguagem tem implicação direta na construção do racismo, pois, durante a invasão colonial, ela foi usada como evangelização, como uma forma de negar a existência do outro, reprimindo o multilinguismo dos povos africanos e indígenas. “Vivemos em um país de cidadanias linguísticas negadas”, afirma. O docente também explicou que o racismo é uma instituição estruturante, que não é simplesmente uma ideologia ou um discurso, mas é uma formação histórica que lega aos negros o fracasso.
O professor Ivo Ferreira falou sobre o papel do Estado nessa estrutura racista que nega oportunidades a pessoas negras, evidenciando como o Estado, através de leis como Lei de Terras (Lei n. 601 de 1850) e a chamada Lei da Vadiagem (decreto-lei 3.688 de 1941), foi responsável pela marginalização da população negra no país. Sobre linguagem e racismo, o professor afirma que “foi imposto para a gente que existe um jeito correto de falar e um jeito certo de escrever, o que na verdade é um patrulhamento para tirar de cena determinados atores que não teriam essa oportunidade pela questão histórica”.
Levando a discussão sobre racismo da linguística para a biologia, a docente Alexandra Bonfim afirma que, para a biologia, não há fundamento científico para que a espécie humana seja classificada em raças, embora as classes dominantes tenham se apropriado em vários momentos históricos de argumentos biológicos para sustentar o racismo, como o uso da teoria da Eugenia. Para ela, é fundamental que os alunos compreendam isso, entendam sobre a evolução do homem, que existe apenas uma espécie humana na Terra hoje e que ela nasceu na África, para que possam desconstruir a ideia de racismo.
Com a intenção de provocar reflexões ainda mais profundas, ela se juntou a professores de outras áreas no Campus Teixeira de Freitas em um projeto transdisciplinar de combate ao racismo que tem realizado atividades e discussões de filmes com essa temática entre os alunos.
“Pesquisa é pop”: mesa discute desafios da popularização da ciência
Na tarde de quinta-feira, 17, ocorreu a mesa “Pesquisa é pop”. O debate sobre divulgação da ciência contou com a participação de Luiz Gustavo de Almeida, gerente de mídias sociais do Instituto Questão de Ciência (IQC) e criador do projeto Pint of Science; do docente da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e criador do Blog “Ornitorrinco curioso”, Marco Antônio Amaral; e do gerente de conteúdo do TikTok Brasil, Ronaldo Marques. O encontro foi mediado pelo docente do IF Baiano, Campus Catu, Marcelo Souza Oliveira.
Além de apresentarem seus trabalhos como divulgadores científicos e projetos das instituições que representam, eles debateram os desafios de falar sobre ciência atualmente. Um dos pontos altos do debate foi a discussão sobre fake news e propagação de desinformação científica nos ambientes digitais.
“Hoje, a opinião das pessoas tem implicado mais do que a verdade”, comentou Marco Antônio Amaral. “A gente tá numa época em que a verdade é irrelevante. Muita gente acredita na terra plana por falta de conhecimentos em metodologia científica, mas muita gente não”. Além disso, ele destacou características das fake news e como hoje estão sendo pensadas soluções para o problema. “A gente tem projetos de combater fake news, só que cada grupo está tentando de uma forma. Tem gente que acha que tem que banir fake news e proibir quem compartilha. Tem gente que tem aquela ideia da política de censura, ‘boazinha’, ‘do bem’, onde a rede social vai censurar os conteúdos. Tem outros que acham que é o governo que tem que censurar, tem gente que acha que não. O que mais tem é gente afirmando que ‘com certeza esse método é o verdadeiro’. Mas, sendo sincero, até hoje ninguém sabe.”
Sobre o papel das redes sociais nesse panorama, Ronaldo Marques pontuou que elas funcionam como veículos que propagam as informações falsas geradas pela própria sociedade. “Uma pessoa que está disposta a compartilhar uma mentira, seja por que ela quer divulgar, seja por que acredita naquilo, ou porque tem interesses por trás da divulgação daquela mentira, vai fazer isso como ela faz na vida real, mas de um jeito anônimo e com um potencial muito grande de alcançar outras pessoas”, ressaltou. No entanto, ele também acredita que as redes também podem ser um remédio para esse problema. “É pelas redes sociais que você combate fake news, que você compreende como as pessoas estão divulgando seu saber e onde você consegue ampliar e chegar em pessoas que, por exemplo, não teriam acesso a informações que são públicas, mas que essas pessoas normalmente não iriam buscar”, completou.
Luiz Gustavo Almeida lembrou que as causas da desinformação ainda estão em debate na academia. “Uma coisa que a gente achava é que era por falta de informação que as pessoas ficam ignorantes. Não é falta de informação. Todo mundo tem celular, por mais que não tenha internet, tem lugar pra ter acesso à internet – claro que tem exceções. Mas não é por falta de informação que as pessoas querem ficar ignorantes. Hoje a gente falou um monte aqui de pessoas que são anti vacina, que acreditam em terra plana. Então, isso é um tipo de ignorância que as pessoas buscam e querem se manter nelas”.
Apesar das razões inconclusivas, Almeida trouxe um caminho para que o trabalho de divulgar a ciência continue. “A gente tem que pensar nisso como um mar de desinformação. A gente tem vários barquinhos e a gente está tentando salvar as pessoas que levantaram a mão e que querem sair dali. Tem uma galera que tá puxando pra baixo pra ir se afogar junto. E não tem como discutir, como convencer essas pessoas de subir no barquinho pra sair desse mundo de desinformação. Mas aquelas pessoas que estão levantando a mão têm um sentimento verdadeiro de tentar sair dali”, concluiu.
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